quarta-feira, 29 de janeiro de 2014

Oh, Paraty!





Após cinco horas de viagem cheguei à cidade. Descobri nas últimas semanas que viajar de ônibus por muitas horas também pode ser um tipo de meditação, uma vez que você é obrigado ou a desenvolver paciência ou a pular da janela. Eram 19hs quando cheguei e ainda restava um pouco de dia, mas não o suficiente para aproveitar uma praia, por isso fui rumo à minha segunda necessidade: carne. Não que a dieta vegetariana do retiro tenha sido ruim, mas o troglodita dentro de mim também precisava de um pouco de atenção. Foi em uma rede desconhecida de fast-food (uma daquelas franquias que sonha em ser Mac Donalds) que eu pedi um combo hambúrguer-batata-refri profundamente decepcionante, mas ao menos fiz meu desjejum de carne.

Próxima prioridade era hospedagem, o plano inicial era ficar em um camping, entretanto o cansaço falou mais forte e eu preferi passar a primeira noite em um confortável hostel. Logo me indicaram o Che Lagarto, que é de uma franquia conhecida, e me hospedei por lá. Como era a minha primeira vez em um hostel fiquei um pouco perdido, ainda mais que estava rolando um clima meio pesado entre o pessoal da recepção. Tomei um banho e parti para o centro histórico que é o marco da cidade.

Hostel Che Lagarto


O centro histórico é uma amálgama de todo tipo de turismo. Pode parecer uma disneylândia barroca, um bairro boêmio, ou um shopping de artesanatos dependendo do ângulo que você avaliar. É certo que tem seu charme, ainda que este tenha sido plastificado para turistas, pois uma multidão enorme desses povoa a cidade dia e noite como se fosse um parque artificial criado para eles. Recomendo passear pelo centro histórico durante as primeiras horas da manhã (não reclame de acordar cedo!) quando está tudo vazio e se pode ter melhor a experiência de andar em ruas que pouco mudaram em séculos e sentir-se verdadeiramente em uma outra época. Logo depois as lojinhas começam a abrir e você pode comprar aquelas clássicas lembrancinhas.









Por volta das 11hs fiz o checkout do hostel e decidi que era hora de aproveitar uma praia, fui para praia de Jabaquara que fica a uns 15 minutos a pé do centro, onde eu sabia que havia um camping barato chamado Cavalo Marinho. Depois de andar sob o sol do meio dia cheguei aliviado ao camping, que é um pouco escondido. Fui recebido pelo Seu Zé, um mineiro muito gente boa dono do camping, que cobrou R$25 a diária. Estava esperando R$15 pelo que tinha me informado, mas aparentemente desde a última temporada ele havia melhorado a estrutura e estava cobrando mais caro. Resolvi ficar, por falta de opção e simpatia pelo lugar.

Camping


Montada a barraca (e não se esqueçam de que fazia um calor incrível com o sol a pino!) resolvi finalmente dar meu primeiro mergulho no mar para refrescar. Ha! Pegadinha do malandro! Quem disse que deu para refrescar mergulhando na água? Incrivelmente o mar em Paraty é QUENTE. O perfil das praias que vi lá é bem peculiar: água rasa por uma longa distancia mar adentro e temperatura morna. Fiquei de queixo caído, e acabei por refrescar-me na ducha do camping.

Jabaquara


O Cavalo Marinho foi o lugar que mais gostei de ficar, primeiro que as pessoas lá eram simples, muitos eram artesãos que viajam por aí. A impressão ao observar algumas pessoas no hostel foi de que estava assistindo 'malhação' em inglês, enquanto que no camping a simplicidade das pessoas me deixou muito mais confortável. No horário do almoço alguns amigos se juntaram e fizeram um caldo de peixes, chegando na cozinha um já me ofereceu o resto na panela dizendo 'põe uma farinha aí e faz um pirão', apresentado o pessoal vi que muitos ali eram argentinos e já puxei conversa (Descobri que mineiro e argentino é o que mais há pela cidade, ao ponto de virar piada). Havia até mesmo um senhor de uns sessenta e poucos anos, indígena peruano que fazia artesanatos incríveis com folhas de palmeira e parecia o senhor Miagi, e também um colombiano que tocava flauta andina muito bem, dando ao lugar um clima de latinoamérica. Mais tarde me convidaram para dividir um 'fernet' uma bebida que tomam na Argentina, que infelizmente não pude provar pois demoraram para buscar e a loja já havia fechado. Mesmo sem o fernet foi acendida a fogueira que acompanharia a festa, e aproveitei um tempo olhando para ela enquanto um colega de camping tocava (e muito bem!) um violão para fechar a noite.



No dia seguinte de manhã aproveitei para ver o sol nascer, como estava frio nas primeiras horas do dia as águas mornas ficaram mais interessantes de se aproveitar. Depois fui conhecer o forte e a praia do pontal. A paisagem vista do forte é linda, mas a visita ao lugar não é muito mais do que isso, para quem espera uma fortificação de pedra digna de ter defendido Paraty contra o ataque de piratas como Jack Sparow vai se decepcionar. É basicamente um prédio pequeno e umas muretas pequeninas que até a minha avó pularia, com alguns canhões e nada mais. A praia do pontal logo ao lado também é rasa de águas mornas, e com um quebra-mar de pedras muito interessante de ver.

Praia de Jabaquara

Canhão do forte


De volta ao camping preparei uma feijoada em lata e desmontei a barraca para ir a Trindade, onde diziam que as praias eram melhores. Espero que com mais prática montar e desmontar acampamento se torne mais fácil e rápido, afinal desarmar a barraca e preparar a mochila não são atividades muito divertidas. Para Voltar da praia de Jabaquara para a cidade é preciso atravessar o morro do cemitério. Eis que depois de uma subida cansativa com o peso nas costas e o sol da tarde na cabeça eu resolvo parar na escadaria do cemitério para descansar. Dez minutos sentado, energia renovada, ponho a mochila nas costas, me levanto e ploft!

O azar de um degrau alto, combinado com uma mochila grande nas costas e um pouco de desatenção resultaram em uma torcida no tornozelo. Ok, muita calma nessa hora. No instante em que senti a dor sabia que a paraty tinha acabado ali. Se não fosse o retiro de meditação com certeza ficaria frustrado, irritado e reclamaria contra os céus pela desgraça bem no meio das férias. Por incrível que pareça encarei a situação tranquilamente, sem me incomodar com a dor (vipassana na veia!) nem me frustrando com a situação. Imprevistos acontecem cedo ou tarde, isso é inevitável, é escolha nossa sofrer por causa deles ou aceitarmos a situação.


'Start again, with a caaalm and quiet mind...'


Coloquei o coturno militar para firmar o tornozelo e me apoiando no bastão de trekking manquei até o pronto socorro. Sabia que não era nada sério e fui mais para garantir, tirei uma chapa de raio x e constataram que estava tudo ok, somente uma torção leve. O pronto socorro fica perto da praia do pontal e continuei a mancar até lá para ficar em um hostel. O pessoal do quarto era legal (somente gringos) e me convidaram para uma cerveja, só que depois de um dia como aquele foi só tomar um banho e desmaiei de sono depois.

O equipamento salvou o dia


Dia seguinte, a adrenalina que segura as pontas nesses casos tinha passado e então começou a doer. Aproveitei para ver o sol nascendo na praia e tomar o café da manhã do hostel no quiosque deles. Arrumei a mochila e com muita cautela andei o calçamento histórico até a rodoviária. Descobri que acessibilidade para deficientes não é o forte da cidade. Uma hora para andar quase nada, não foi muito eficiente mas cheguei na rodoviária. Próximo ônibus para São Paulo: em 10 minutos. Nem tive tempo para ligar para os meus parentes e avisar que estava indo embora, tive que ligar de uma parada na estrada. Algumas horas depois já estaria em sampa no horário de pico, mancando, com uma mochila enorme nas costas precisando atravessar a cidade do terminal Tietê até a zona sul. Algo bem diferente de passear por paraty.




ps: Não parei o mochilão, a próxima parada era em São paulo mesmo, só prossegui por que em sampa tenho parentes e não faria sentido ficar em Paraty gastando sem nem ao menos poder nadar na praia...

Mais fotos em : Álbum facebook

domingo, 26 de janeiro de 2014

Da partida ao Vipassana


Partida



Dia 08/01, finalmente tinha chegado a data de partida. Pensava que iria ficar ansioso e começar a pensar mais na viagem à medida que esta se aproximasse, mas ocorreu o contrário, nos últimos dias ela pareceu menos importante e os dias passavam como dias normais, sem ansiedade, como se a semana seguinte fosse ser igual à anterior. Até o momento em que embarquei nada indicava que começaria uma viagem de meses. Mas à medida que o ônibus ia cruzando a cidade eu ia notando tantas coisas familiares ficando para trás antes que mergulhasse na escuridão da estrada e já comecei a ter saudades.

Ao chegar no Rio de Janeiro não vi nada de cidade maravilhosa; barracos, casas no tijolo, vielas escuras e pessoas infelizes indo trabalhar antes das cinco da madrugada, a paisagem não ajudou a me animar. Quando notei em algumas pilastras de viaduto os murais do Gentileza me senti melhor, como se me dissessem: 'ok com essa tristeza, mas também tem coisas boas no mundo, não se esqueça'.

Vipassana


“Start again, start again...
With a caaaalm and quiet mind....”

Tive de esperar umas duas horas antes de embarcar para Miguel Pereira onde faria o retiro de meditação vipassana. Para se chegar na cidade é preciso subir a serra, que parece interminável de tantas curvas, mas ainda assim é uma paisagem para se apreciar. Cheguei bem cedo por volta das 9hs, e deveria estar no centro de vipassana a partir das 14, o que me deu um tempo para descansar. Logo chegaram mais pessoas que estavam indo para o retiro e começamos a combinar de dividirmos um táxi quando algumas pessoas do vipassana passaram pela rodoviária e nos ofereceram carona até lá.

Rodoviária de Miguel Pereira

O retiro é uma experiência a parte. A grosso modo é como viver durante 10 dias como um monge, 10 horas de meditação por dia, voto de silêncio, e autodisciplina rígida, mas não é disso que o retiro é feito, a verdadeira experiência é profunda e pessoal demais para ser explicada aqui, e somente passando por algo assim se pode ter parâmetros para avaliar.

O local onde é realizado, o Dhamma Santi, é lindo, no meio da mata atlântica, o que ajuda muito a se desligar um pouco do mundo de fora, o que é necessário durante o curso. Esse detalhe e muitos outros, que podem parecer banais a primeira vista, são importantes para manter a concentração necessária para trabalhar a técnica como se deve.

Nascer do sol visto do dormitório


Depois de dez dias a sensação é de estar mais consciente de si mesmo, alguns saem mais abalados, outros mais leves, alguns não levam a sério e passam pela experiência superficialmente, é algo pessoal, mas dificilmente você passa por algo assim sem uma carga de autoconhecimento.

Muitos quando ouvem falar de '10 dias em silencio' (o que inclui comunicar-se por gestos, olhares, ou qualquer outra forma) pensam que deve ser desesperador algo assim. O que acontece é o contrário. No final dos 10 dias todas as pessoas falaram que o silencio ajudou durante o retiro e que inclusive ele poderia durar mais tempo. Notamos o quanto o tempo todo falamos coisas totalmente desnecessárias, por costume, por vicio de falar, o quanto somos mais prudentes e atentos no silencio. Alguns comentaram que 'todo relacionamento deveria começar com dez dias de silencio' - uma teoria interessante da qual não vou discordar.

Rodoviária do Rio de Janeiro

Na manhã depois do último dia juntamos algumas pessoas que iriam para o Rio e alugamos uma van. Descendo na rodoviária fui comprar a passagem para Paraty, pensando que chegaria lá no final da tarde. Perguntei para um colega do rio se a viagem era de umas 2 horas e ele me respondeu rindo que na verdade eram umas cinco horas, que embora parecesse perto eu só chegaria no final do dia. Embarquei as 14hs para chegar perto das 19hs, em parte do caminho sentei ao lado de um inglês que tinha acabado de chegar ao Brasil e ajudei ele com mais informações sobre nossas terras tupiniquins. Chegando em Paraty tudo o que eu queria era uma praia e um hambúrguer, mas isso fica para o próximo post.

Usina nuclear de Angra dos Reis vista da estrada


sexta-feira, 3 de janeiro de 2014

Planejamento


É um pouco difícil falar desses planos por que na verdade nunca passaram de rascunhos. Parte da emoção está em em não ter rumo muito certo, por isso até agora só defini os contornos da partida.

Tudo começa dia 08/01/2014. Antes de planejar essa viagem já havia agendado um retiro de meditação vipassana para essa época, que depois resolvi emendar com mais alguns destinos até que tudo se tornou uma bola de neve e eu já estava pensando em visitar Machu Picchu. Para quem não conhece meditação vipassana há mais informações aqui. Alguns amigos meus já fizeram esse retiro antes e me recomendaram imensamente, e não pude pensar em uma maneira melhor de deixar tanta coisa para traz e fazer um recomeço, do que sentando em meditação por alguns dias.


Passagem comprada!


Saindo do retiro dia 18/01 planejo ir a Paraty, uma cidade que estou esperando conhecer há muito tempo, depois São Paulo (por questões burocráticas) e enfim Buenos Aires!

Esperava arranjar algum emprego temporário em BA*, mas não consegui nada definido até agora. De qualquer maneira aproveitarei algum tempo em BA para planejar meu rumo a partir daí, conversar com argentinos e outros turistas pode me dar mais perspectivas de aonde ir. Uma das possibilidades é pegar a famosa 'Rota 40', uma estrada que corta quase toda a extensão da Argentina desde o noroeste até o extremo sul na Terra do Fogo. Há também destinos no Chile e outros países à frente, mas por enquanto vou manter a expectativa.


*Buenos Aires