Após
cinco horas de viagem cheguei à cidade. Descobri nas últimas
semanas que viajar de ônibus por muitas horas também pode ser um
tipo de meditação, uma vez que você é obrigado ou a desenvolver
paciência ou a pular da janela. Eram 19hs quando cheguei e ainda
restava um pouco de dia, mas não o suficiente para aproveitar uma
praia, por isso fui rumo à minha segunda necessidade: carne. Não
que a dieta vegetariana do retiro tenha sido ruim, mas o troglodita
dentro de mim também precisava de um pouco de atenção. Foi em uma
rede desconhecida de fast-food (uma daquelas franquias que sonha em
ser Mac Donalds) que eu pedi um combo hambúrguer-batata-refri
profundamente decepcionante, mas ao menos fiz meu desjejum de carne.
Próxima
prioridade era hospedagem, o plano inicial era ficar em um camping,
entretanto o cansaço falou mais forte e eu preferi passar a primeira
noite em um confortável hostel. Logo me indicaram o Che Lagarto, que
é de uma franquia conhecida, e me hospedei por lá. Como era a minha
primeira vez em um hostel fiquei um pouco perdido, ainda mais que
estava rolando um clima meio pesado entre o pessoal da recepção.
Tomei um banho e parti para o centro histórico que é o marco da
cidade.
Hostel Che Lagarto
O centro
histórico é uma amálgama de todo tipo de turismo. Pode parecer uma
disneylândia barroca, um bairro boêmio, ou um shopping de
artesanatos dependendo do ângulo que você avaliar. É certo que tem
seu charme, ainda que este tenha sido plastificado para turistas,
pois uma multidão enorme desses povoa a cidade dia e noite como se
fosse um parque artificial criado para eles. Recomendo passear pelo
centro histórico durante as primeiras horas da manhã (não reclame
de acordar cedo!) quando está tudo vazio e se pode ter melhor a
experiência de andar em ruas que pouco mudaram em séculos e
sentir-se verdadeiramente em uma outra época. Logo depois as
lojinhas começam a abrir e você pode comprar aquelas clássicas
lembrancinhas.
Por volta
das 11hs fiz o checkout do hostel e decidi que era hora de aproveitar
uma praia, fui para praia de Jabaquara que fica a uns 15 minutos a pé
do centro, onde eu sabia que havia um camping barato chamado Cavalo
Marinho. Depois de andar sob o sol do meio dia cheguei aliviado ao camping, que é um pouco escondido.
Fui recebido pelo Seu Zé, um mineiro muito gente boa dono do
camping, que cobrou R$25 a diária. Estava esperando R$15 pelo que
tinha me informado, mas aparentemente desde a última temporada ele
havia melhorado a estrutura e estava cobrando mais caro. Resolvi
ficar, por falta de opção e simpatia pelo lugar.
Camping
Montada a
barraca (e não se esqueçam de que fazia um calor incrível com o
sol a pino!) resolvi finalmente dar meu primeiro mergulho no mar para
refrescar. Ha! Pegadinha do malandro! Quem disse que deu para
refrescar mergulhando na água? Incrivelmente o mar em Paraty é
QUENTE. O perfil das praias que vi lá é bem peculiar: água rasa
por uma longa distancia mar adentro e temperatura morna. Fiquei de
queixo caído, e acabei por refrescar-me na ducha do camping.
Jabaquara
O Cavalo
Marinho foi o lugar que mais gostei de ficar, primeiro que as pessoas
lá eram simples, muitos eram artesãos que viajam por aí. A
impressão ao observar algumas pessoas no hostel foi de que estava
assistindo 'malhação' em inglês, enquanto que no camping a
simplicidade das pessoas me deixou muito mais confortável. No
horário do almoço alguns amigos se juntaram e fizeram um caldo de
peixes, chegando na cozinha um já me ofereceu o resto na panela
dizendo 'põe uma farinha aí e faz um pirão', apresentado o pessoal
vi que muitos ali eram argentinos e já puxei conversa (Descobri que
mineiro e argentino é o que mais há pela cidade, ao ponto de virar
piada). Havia até mesmo um senhor de uns sessenta e poucos anos,
indígena peruano que fazia artesanatos incríveis com folhas de
palmeira e parecia o senhor Miagi, e também um colombiano que tocava
flauta andina muito bem, dando ao lugar um clima de latinoamérica.
Mais tarde me convidaram para dividir um 'fernet' uma bebida que
tomam na Argentina, que infelizmente não pude provar pois demoraram
para buscar e a loja já havia fechado. Mesmo sem o fernet foi
acendida a fogueira que acompanharia a festa, e aproveitei um tempo
olhando para ela enquanto um colega de camping tocava (e muito bem!)
um violão para fechar a noite.
No dia
seguinte de manhã aproveitei para ver o sol nascer, como estava frio
nas primeiras horas do dia as águas mornas ficaram mais
interessantes de se aproveitar. Depois fui conhecer o forte e a praia
do pontal. A paisagem vista do forte é linda, mas a visita ao lugar
não é muito mais do que isso, para quem espera uma fortificação
de pedra digna de ter defendido Paraty contra o ataque de piratas
como Jack Sparow vai se decepcionar. É basicamente um prédio
pequeno e umas muretas pequeninas que até a minha avó pularia, com
alguns canhões e nada mais. A praia do pontal logo ao lado também é
rasa de águas mornas, e com um quebra-mar de pedras muito
interessante de ver.
Praia de Jabaquara
Canhão do forte
De volta
ao camping preparei uma feijoada em lata e desmontei a barraca para
ir a Trindade, onde diziam que as praias eram melhores. Espero que
com mais prática montar e desmontar acampamento se torne mais fácil
e rápido, afinal desarmar a barraca e preparar a mochila não são
atividades muito divertidas. Para Voltar da praia de Jabaquara para a
cidade é preciso atravessar o morro do cemitério. Eis que depois de
uma subida cansativa com o peso nas costas e o sol da tarde na cabeça
eu resolvo parar na escadaria do cemitério para descansar. Dez
minutos sentado, energia renovada, ponho a mochila nas costas, me
levanto e ploft!
O azar de
um degrau alto, combinado com uma mochila grande nas costas e um
pouco de desatenção resultaram em uma torcida no tornozelo. Ok,
muita calma nessa hora. No instante em que senti a dor sabia que a
paraty tinha acabado ali. Se não fosse o retiro de meditação com
certeza ficaria frustrado, irritado e reclamaria contra os céus pela
desgraça bem no meio das férias. Por incrível que pareça encarei
a situação tranquilamente, sem me incomodar com a dor (vipassana na
veia!) nem me frustrando com a situação. Imprevistos acontecem cedo
ou tarde, isso é inevitável, é escolha nossa sofrer por causa
deles ou aceitarmos a situação.
'Start
again, with a caaalm and quiet mind...'
Coloquei
o coturno militar para firmar o tornozelo e me apoiando no bastão de
trekking manquei até o pronto socorro. Sabia que não era nada sério
e fui mais para garantir, tirei uma chapa de raio x e constataram que
estava tudo ok, somente uma torção leve. O pronto socorro fica
perto da praia do pontal e continuei a mancar até lá para ficar em
um hostel. O pessoal do quarto era legal (somente gringos) e me
convidaram para uma cerveja, só que depois de um dia como aquele foi só tomar um banho e desmaiei de sono depois.
O equipamento salvou o dia
Dia
seguinte, a adrenalina que segura as pontas nesses casos tinha
passado e então começou a doer. Aproveitei para ver o sol nascendo na
praia e tomar o café da manhã do hostel no quiosque deles. Arrumei
a mochila e com muita cautela andei o calçamento histórico até a
rodoviária. Descobri que acessibilidade para deficientes não é o
forte da cidade. Uma hora para andar quase nada, não foi muito
eficiente mas cheguei na rodoviária. Próximo ônibus para São
Paulo: em 10 minutos. Nem tive tempo para ligar para os meus parentes
e avisar que estava indo embora, tive que ligar de uma parada na
estrada. Algumas horas depois já estaria em sampa no horário de
pico, mancando, com uma mochila enorme nas costas precisando
atravessar a cidade do terminal Tietê até a zona sul. Algo bem
diferente de passear por paraty.
ps: Não parei o mochilão, a próxima parada era em São paulo mesmo, só prossegui por que em sampa tenho parentes e não faria sentido ficar em Paraty gastando sem nem ao menos poder nadar na praia...
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